sexta-feira, 14 de maio de 2010

Síria

Saímos de casa para o aeroporto antes mesmo do dia clarear. Eram cinco horas da manhã e o silêncio da madrugada deixou o som vindo dos minaretes das mesquitas ainda mais intenso. Acontecia a primeira reza do dia e os fiéis encaminhavam-se silenciosamente em direção aos locais de oração enquanto os grilos estrilavam. Embarcamos no voo da empresa low cost SAMA AIRLINES com destino à cidade de Damasco, na Síria.

Acho uma lástima os muçulmanos sauditas não gostarem de fotos e não aceitarem que a máquina fotográfica seja usada em muitos locais públicos. Este voo teria rendido imagens bastante curiosas. A maioria dos passageiros deste trecho eram muçulmanas iraquianas que estavam indo ou voltando da peregrinação até a cidade de Meca, conhecida como “peregrinação menor”, chamada de Umra. Esta peregrinação é feita em qualquer época do ano, diferente do Hajj, que acontece uma vez por ano em determinada data. Tanto o voo de ida quanto o de volta veio cheio destas iraquianas gordas que carregavam imensos sacos em suas cabeças. Elas queriam sentar em qualquer assento e tinham riscos pretos tatuados em seus rostos e suas mãos. Em coro, rezavam em voz alta próximo ao momento do pouso e da decolagem. No voo Damasco-Jeddah houve um atraso em razão de duas destas iraquianas terem defecado no chão da aeronave em frente ao banheiro traseiro. Foi até engraçado!

O visto para entrada na Síria foi retirado no desembarque, mas havia sido encaminhado alguns dias antes através de uma agência de turismo local. De certa forma, achei o aeroporto e a cidade limpos e organizados. A moeda do país é a libra síria, desvalorizada e com muitos zeros. Alguns lugares aceitam dolares americanos e euros. Damasco concorre ao título de “a mais antiga cidade continuamente habitada do mundo”.

Ficamos hospedados no Orient Palace Hotel, localizado na parte antiga da cidade, à 200 metros da parte histórica de Damasco. Em frente ao hotel existe uma vistosa estação de trem desativada, com um relógio em sua fachada e no seu interior fotos antigas da época em que grandes comerciantes e suas mercadorias circulavam por aqui. O hotel é da década de quarenta e conserva a mesma mobília e decoração de antigamente. Sem manutenção e sem grandes confortos, o banho era espetacular e o café da manhã servido com deliciosos baguetes (influência do mandato francês), acompanhados de labnah e azeitonas ao estilo árabe.

Circulamos pelas ruas da cidade e visitamos o Museu Nacional de Damasco, a Capela de St. Ananias e o Azem Palace. Depois de vagarmos por um longo tempo pelos labirintos do Souq al-Hamadiyyeh nos deparamos com a grandiosa Mesquita Ummayad e muitas pombas recebendo alimentos dos visitantes do local. Para entrar neste monumento islâmico, os sapatos são retirados e as mulheres cobrem seus cabelos usando um manto fornecido por eles. Aproveitando para fugir do calor, fiéis realizavam suas refeições sob o piso de mármore existente no pátio. No interior da mesquita, muçulmanos se curvavam em direção a cidade de Meca (centro do universo para eles), cumprindo os rituais diários de reza em homenagem ao grande e poderoso Allah. Os muçulmanos chegaram em Damasco no ano de 636.

Durante estes dias, não usei o meu modelo gótico da vestimenta tradicional muçulmana, e deixei minha abaya repressora trancafiada na mala durante a minha agradável estada na Síria.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Minha Sogra nas Arábias

Existem muitas histórias de problemas de noras e genros com suas sogras. Não é à toa que várias piadas são criadas baseadas neste tipo de relacionamento. Minha mãe tinha vários poréns com minha avó paterna, e minha sogra ídem com a sogra dela. Já eu, não posso me queixar.

Minha sogra veio nos visitar nas arábias, ficou vinte e nove dias na nossa casa, já que o visto que foi-lhe concedido era de trinta dias. Demorou até o visto dela ser liberado pelas autoridades do país. Se o filho dela não fosse casado ou se eu não morasse aqui com ele, o país não emitiria a carta necessária para obtenção do visto junto ao consulado no Brasil. Tudo muito confuso. Porque se inchallah não quiser, nada acontece nas Arábias!

Agendamos com uma agência de turismo local alguns passeios oferecidos a estrangeiros. Passeio de barco pelo Mar Vermelho, visita ao museu e outros locais culturais da cidade, um mercado de animais, e um acampamento noturno para assistir ao ritual do casamento tradicional árabe. Fechamos um pacote com a empresa através de contatos telefônicos e via e-mail. Bem ao estilo saudita, os valores, datas e a programação foram alterados diversas vezes sem argumentos. Nos frustramos durante todas as tentativas, e sendo assim, partimos aos locais que estamos familiarizados para minha sogra conhecer e aproveitar a estada dela em Jeddah.

Fomos novamente à cidade de Taif, desta vez aproveitamos para andar no teleférico. Almoçamos no restaurante do hotel Ramada que fica no cume da montanha. Muitos macacos babuínos apareceram pedindo comida pelas janelas do restaurante fazendo macacadas. Tomamos sorvete no parque aquático existente junto ao teleférico e descemos pelos trilhos dos carrinhos que complementam a diversão do local. Os carrinhos ganharam velocidade e as abayas dançaram esvoaçantes ao vento enquanto muçulmanas cobertas até os olhos acompanhavam seus filhos na piscina. Um agradável passeio pela região serrana do deserto saudita!

Fomos atrás de leite de camela fresquinho e levamos minha sogra para se apresentada aos camelos do deserto, conhecidos como dromedários. Existem várias tendas com pequenas criações de camelos à beira da estrada. Os grandes bichanos blateraram fortemente ao chegarmos. As tetas das camelas estavam protegidas por bolsas e eles ordenharam uma delas para vender dois litros de leite para nós. A bacia encheu-se com uma branquíssima e farta espuma. Os beduínos leiteiros não davam uma palavra em inglês, mas sorridentes, fizeram pose para as fotos que tirávamos. Voltei com um saco de leite quentinho em meu colo, e ao chegarmos em casa, bebemos este cremoso e saboroso leite que ainda estava morno. Com o restante do leite, peparei uma ambrosia e um pudim de leite de camela. Tudo testado e aprovado pela minha sogra. A sogrona partiu satisfeita da temporada nas arábias e teve momentos bastante agradáveis ao lado do filho e da nora. Precisou comprar outra mala para transportar suas compras e teve que deixar outras tantas para levarmos depois.

Tenho sete textos escritos pela metade que precisam ser terminados para poder postá-los. Nem mesmo Allah, com seus super-poderes vai fazer isto por mim. Preciso sentar na frente do computador para concluí-los, coisa que tenho deixado de lado nos últimos meses. Até mesmo e-mails eu tenho deixado de responder. Um horror! Este post é um dos sete que estavam pendentes, e devido a uma amiga que malcriadamente me falou esta semana que os meus contos estavam desatualizados, resolvi terminar pelo menos este. Se ela não anda tonta, eu ando. O meu mundo anda girando muito rápido e já estamos no final de abril!

domingo, 11 de abril de 2010

Convescotes no Deserto

Tive a oportunidade de participar de alguns convescotes na Arábia Saudita. Alguns brasileiros temem este tipo de programa e negam-se a seguir os demais. Outros já foram em algum e juram nunca mais voltar. Como eu não tenho medo e não sofro com o conforto limitado, recomendo a aventura. O medo de alguns é devido a um grupo de nove franceses que foram sumariamente assasinados em fevereiro de 2007 quando visitavam a região do deserto nas proximidades de Jeddah. Volta e meia surgem convites para nos juntarmos a outras pessoas e seguirmos em comboio atrás de espaços perdidos na imensidão do deserto. Sinto-me atraída por eventos que venham acompanhados de certa emoção. Preciso de adrenalina para nutrir meu coração!

O programa diário entre os sauditas é estenderem seus tapetes para realizarem piqueniques em qualquer canto ou lugar. Famílias inteiras reunem-se em cima de imensos tapetes, sentadas ao redor de aparelhos de narguilé fumando suas shishas aromáticas. Pode ser em uma praça, nos canteiros das avenidas, na praia, nas calçadas ou em qualquer terreno baldio. Em todo lugar é permitido que você se abanque e monte seu acampamento. Nas lojas e em qualquer supermercado você encontra utensílios para acampamentos e convescotes. Existem quiosques em toda a extensão da Corniche Road (Beira Mar) onde eles vendem tapetes, encostos de suvaco e outras mordomias para tornar seu piquenique mais confortável. É a diversão mais comum em Jeddah, é lindo de se ver!

Na aridez descampada do deserto você encontra muitas belezas. Em um dos convescotes, conhecemos uma região onde haviam infinitas pedras coloridas de variadas formas e tamanhos. Pedras brancas, verdes, rosas, cinzas e roxas de diferentes tons. O chão estava coberto destes minerais vindos de um tempo remoto. Admirável! Nestes piqueniques longe das cidades, a mulherada aproveita para andar sem as abayas e circulam sem os modelitos islâmicos.

Em um outro piquenique, o pretexto gastronômico foi o de preparar churrasco, outras guloseimas e uma fogueira. Andamos uns cinquenta quilômetros para os lados da cidade de Usfan. O comboio parou no meio do caminho para comprar gravetos e lenha em uma tenda de beduínos e depois seguiu até o local do acampamento antes do sol se pôr. Ao chegar, acomodei meus apetrechos e instalei-me confortavelmente em um tapete, ficando apoiada em um travesseiro mágico. Reclusa em meu silêncio, observei o corre-corre das formigas, as chamas da fogueira e acompanhei o céu se encher de estrelas. Dificilmente consigo ver estrelas na escuridão dos céus de Jeddah. Mas ao nos distanciarmos da capital, a beleza das constelações em firmamento se fizeram presentes. Baseada em meus conhecimentos precários em astronomia, localizei facilmente as Três Marias e fui atrás das luzes da constelação de Órion... Acredita-se que a palavra “arábia” signifique uma “constelação de estrelas”. Isso até passa a fazer algum sentido pela adoração ao sol, a lua e as estrelas que tem sido praticada nesta região desde os tempos antigos.

Girando na ciranda do colorido, gosto de fazer o meu julgamento sobre as coisas, testar sabores com meu próprio paladar e ver paisagens com meus próprios olhos. Observar os prazeres da arte, da natureza e do clima. Curtir pedras sobre pedras, o céu de brigadeiro, e as areias cor de mel antes e depois da noite chegar!

terça-feira, 23 de março de 2010

Um ano em Jeddah

Está fazendo um ano que fixei residência no Reino da Arábia Saudita, na cidade de Jeddah. Muitos achavam e talvez continuem achando um grande delírio morar neste país de religião e cultura excêntricas. Eu estou amando passar por esta experiência e poder viver neste lugar que difere-se do mundo ocidental em muitas coisas. Uma oportunidade única! Kimbah, nosso filho felino, também está amando. Ele passou de um reles bicho vivo de pelúcia de apê para um gato rueiro e apaixonado. O Gato está se sentindo um tigre nas Arábias. A família segue feliz vivendo pelo Oriente Médio... Meu marido, mais do que nunca, diz que o mundo se divide em dois: o mundo ocidental, e o resto.

Por incrível que possa parecer, Jeddah é uma cidade arborizada e florida. Frondosas flamboaiãs, palmeiras, coqueiros e muitas tamareiras contrastam com a paisagem do deserto e as águas do Mar Vermelho. Além do sistema de irrigação instalado nas áreas de lazer espalhadas pela cidade, caminhões-pipa dão de beber às flores e árvores que desabrocham e florescem nos canteiros das grandes avenidas. Poucas ruas possuem nomes, somente as principais, e não existe numeração nos prédios. Você deve procurar endereços por referências. Com o passar dos meses a desorganização passa a ser comum e você acaba acostumando-se com a idéia e achando o que procura. A pessoa que pretende receber algo pelo correio, até mesmo uma simples fatura de cartão de crédito, deve procurar os correios e alugar uma caixa postal. Organizamos nossas saídas de casa com base no horário das rezas, já que são cinco rezas diárias e todo o comércio fecha por aproximadamente trinta minutos. Nos supermercados, eles anunciam que a reza vai começar e você tem que correr até o caixa mais próximo para passar suas compras, ou terá que esperar a reza terminar. Percebi que meu marido passou a gostar de irmos próximo destes horários. Neste caso, não consigo concluir a compra de todos os meus desejos insanos e o valor da conta acaba sendo mais baixo.

Li e escutei muitas histórias a respeito dos costumes antes de virmos para cá. A fatura do cartão de crédito chega em números árabes e vem com a data do vencimento de acordo com o calendário lunar, deixando sua decifração quase impossível até mesmo para os habitantes do planeta árabe. As vezes, quando mulheres andam desacompanhadas, alguns árabes gostam de espichar o olhar, principalmente para estrangeiras com cabelo descoberto. Mas também não dou chance ao azar. Uma vez fui perseguida em um shopping da cidade por um destes arabinhos devidamente fardados. Deixei o senhor gordo de meia idade zonzo e despistei-o em uma loja que possui sistema de escadas rolantes em seu interior. Todos os outros acontecimentos neste sentido são de pouca importância e não passam de olhares curiosos de um povo que foi, e continua sendo, criado e educado com base nas interpretações distorcidas do Livro Sagrado do Islamismo, o Alcorão. Alguns jovens que tiveram dinheiro para estudar nos Estados Unidos ou na Europa, parecem pensar um pouco diferente. As vezes, parece que a nova geração vai parar de seguir o calendário lunar lunático e passar a seguir o calendário gregoriano, como fazem a maioria dos simples mortais.

O que uma sociedade acha estranho, a outra pode achar como sendo normal. No transcorrer deste ano que passou, vivendo delirantemente por estas bandas do globo terrestre, aprendi coisas novas e enriqueci meus pensamentos. Fiquei um ano mais velha, cresci por dentro e alimentei a alma da criança que ainda existe dentro de mim, que não faz muita questão de virar adulta nem tão pouco envelhecer.

domingo, 28 de fevereiro de 2010

Retorno ao Cárcere Saudita

De férias em Porto Alegre, passei a sentir saudades da minha rotina saudita. A sensação de ter dois lares é por vezes estranha. Quando você está se acostumando com um, chega a hora de partir para o outro. Somente agora pude mexer na mudança vinda do período em que moramos em Taipei, Taiwan. Muitas surpresas ao abrir cada caixa: talheres, louças, objetos chineses, imagens e quadros de Buda. Um mundo de quinquilharias que poderiam ter se perdido nas profundezas dos oceanos durante o trajeto até o Porto de Rio Grande. Mas eu senti apego a elas e agora precisarei tempo e lugar para acomodá-las em nossa residência gaúcha. A nostalgia fez-se presente no desencaixotar e veio acompanhada de relatos que passavam em minha mente. Peças nutridas de emoções que acompanharão minha historieta terrena. Preciso exercitar mais o desapego.

Os últimos dias da temporada gaudéria de verão foram assoberbados. Todas as manhãs participava de aulas para aprender a fazer flores artificiais. De volta à Jeddah, continuei praticando esta arteterapia em solo arábico e fazendo flores de tecido para transformá-las em porta docinhos personalizados. Junções familiares, reencontros em botecos, e uma festa de encerramento da temporada que foi dedicada ao primo Osama, compuseram os rituais festivos antes do meu retorno. A festa foi no BAR BONGÔ, na Cidade Baixa, onde o mulherio passou a noite pedindo o sorteio do camelo que cantarolava em árabe, camelo este originário da arábia, legítimo! Os músicos da banda que faziam o show no local nos negaram o palco para realização do sorteio, e tive que subir nas caixas de som do bar para retirar o papel com o nome e divulgar o grande ganhador. Não imaginava que fosse dar tanto ibope, todos queriam levar o camelo baio para casa.

Sempre gostei muito de beber cerveja. Ainda menina, nos finais de semana, meus pais me deixavam beber um copo de Malzibier durante as refeições. Achava aquela bebida docinha uma verdadeira delícia, e acabei pegando gosto pela coisa. Neste vai e vem de acontecimentos, nunca havia pensado em produzir minha própria cerveja. Como na Arábia Saudita o consumo e a venda de bebidas alcoólicas é proibida, passamos a fazer nossa cerveja em casa. Na primeira safra, colocamos até rótulo com logotipo nas garrafas do IKEA, e batizamo-as de Falcon Beer. Além de gostar de beber cerveja, fiquei interessada em suas alquimias e passei a ler um pouco sobre o assunto e procurar curso na área para aperfeiçoamento da técnica caseira atual. Como aprendiz e sem vislumbrar maiores interesses, me inscrevi no curso de cerveja artesanal da Escola de Gastronomia Aires Scavone, em Porto Alegre. O curso teve duração de um dia, e no início da tarde tivemos uma gostosa pausa para um delicioso almoço germânico na escola. Fiquei vidrada com a beleza das folhas verdes de uma linda muda de lúpulo que os mestres cervejeiros apresentaram orgulhosos. Entre controles de temperaturas, altas fervuras, maltes e fermentos, me juntei à turma de interessados em produzir a cerveja “Pale Ale”. Meu paladar ficou tremendamente satisfeito após a degustação, e ofereço esta refrescante bebida bendita a todos os Deuses em seus seis mil anos de história e a todos os outros anos que ainda virão. Meu retorno à Arábia Saudita deu-se um dia após eu me inteirar dos ingredientes e segredos sobre a fabricação da cerveja de panela. Tornei-me uma paneleira confessa. Somos “home brewers” das arábias.

A mesmice consiste em não existir marasmo.O mundo continua a girar... Assim os dias passam e sigo me divertindo pelo deserto. Sem álcool, sem drogas e sem rock n’ roll!



sábado, 20 de fevereiro de 2010

Temporada Brasileira

Sobrevoar a região de Porto Alegre antes de pousar no Aeroporto Salgado Filho me deixa em estado de euforia. É bom poder retornar ao lugar de onde viemos, a nossa terra natal. Chegar ao desembarque e ser esperada por pessoas especiais, não tem preço, é melhor que Mastercard. Tem gente que nem chega a sentir falta da gente, e tem aqueles que dizem que você faz falta, fazem drama, e quando você chega não conseguem um mísero tempo para te ver. São coisas da vida moderna. Fazer o quê?!

O roteiro gastronômico não ficaria de fora durante a minha estada brasileira. Fiz churrasco com minhas próprias mãos, percorri meus restaurantes prediletos e pude provar outros tantos. Descoberta pelo meu irmão a alguns anos atrás, fomos várias vezes na churrascaria Porto Belo, na rua São Manoel. Sou fã da salada de maionese que eles fazem lá. Mas como churrasco bom tem que ser de costela, estivemos na Costela no Rolete. Costela de gado, de porco e leitão à pururuca; sempre regadas com cerveja geladíssima de marcas locais excelentes. Saboreei o risotto de funghi do Peppo Cucina e realizei o desejo de conhecer e provar a culinária francesa do Restaurant Chez Philippe. O ambiente dos jardins no casarão da Av. Independência é agradável e de muito bom gosto. O serviço, a entrada e a sobremesa foram um verdadeiro desastre, salvou-se a caipirinha e o prato principal que estava maravilhoso.

Tenho verdadeira paixão por organizar festas. Gosto de pensar em cada detalhe, dos comes à decoração. Não achando galhos de pinheiro para vender na Ceasa e em meio a ataques de fixação e crises em busca da perfeição, fui com uma amiga a uma praça no bairro Jardim Lindóia. Sentamos para conversar ao lado de dois pequeninos pinheiros, e entre uma conversa e outra, fui desgalhando os coitadinhos até ficaram depenados. Peço que Papai Noel não me castigue por este Crime Ambiental cometido antes da noite feliz. Não quis preparar para a ceia aquele menu tradicional que não satisfaz muito o meu paladar. Resolvi produzir bacalhau ao molho de natas, purê de mandioquinha, salada de aspargos, fios de ovos, torta de sorvete com calda quente de chocolate (minha especialidade), panetone e damascos recheados com chocolate branco e flores comestíveis. Caprichei mais uma vez nesta festividade de fim de ano e preparei um ambiente com esmero para receber a família do meu marido, meus irmãos e três amigas queridas.

Buscando renovar energias e agradecer os bons feitos ocorridos em 2009, arrumei as malas e peguei a estrada em direção ao litoral. Destino: A bela e Santa Catarina! Cada vez que retorno a Florianópolis fico mais apaixonada. Cidade eclética e cheia de novidades. O charme e a tranquilidade de jantar e passear em Santo Antônio de Lisboa, o filé e as batatas flambadas no badalado Chopp do Gus e o banho de mar são coisas que deixam a vida cor-de-rosa. Fazem tudo valer a pena. A virada do ano foi brindada em uma grande festa na casa de amigos, na localidade de Rio Tavares. Saudamos 2010 até o dia amanhecer e o DJ transcender, para não restar dúvidas de que o novo ano chegaria...

O prazer é um grande propósito para se viver e a gula é uma fonte de prazer. Pode ser o cachorro quente do Rosário, uma à La Minuta na beira da estrada, um caldo de cana ou uma mariola. Tudo vira um delicioso banquete quando estamos acompanhados de pessoas especiais. Que venha 2010!

domingo, 31 de janeiro de 2010

Brasil com Pit Stop Germânico

Minha ida ao Brasil no final de 2009 estava programada, por vezes foi cancelada, e no final do segundo tempo acabou acontecendo. É um ritual ir ao Brasil. Fico bastante eufôrica para rever minhas amigas e meus irmãos mais uma vez. Nas malas, muitos presentes cruzam continentes para agraciar meus entes queridos e compensar minha distância entre oceanos. É época de Natal!

Meu marido meu deixou no aeroporto internacional King Abdul Aziz, na Arábia Saudita, três horas antes do voo decolar. Por ser a época da peregrinação dos muçulmanos à Meca, o movimento no aeroporto estava além do normal. Todo ano, quatro milhões de muçulmanos viajam a Meca para realizar esta peregrinação anual, chamada de Hajj. Vão até Caaba para beijar e dar várias voltas ao redor da pedra preta que tem quatro mil anos. Ao término da peregrinação, os religiosos ainda sacrificam um cordeiro para cumprir este ritual de intensa fé islâmica. Os peregrinos, homens nús, envoltos em toalhas brancas sem costura e fixas ao corpo por um cinturão branco, circulam pelo aeroporto. Despacham, entre suas bagagens, galões das águas sagradas do poço de ZAM-ZAM. Verdadeiras caricaturas que parecem ter saído dos livros de história.

Na sala de embarque, encontrei uma poltrona perdida em meio à multidão. Rabiscava em meu caderninho de anotações enquanto aguardava a chamada do voo LH 597 rumo à Frankfurt. Meu olfato apurou fortes cheiros e tentei adivinhar quanto tempo as pessoas ao meu lado e suas vestimentas não se refrescam em água e sabão. Muitos destes são idosos que juntaram o dinheiro de uma vida toda para cumprir um dos cinco pilares do Islã, que é a peregrinação a Meca pelo menos uma vez na vida. Os membros da família real, que não são poucos (em torno de cinco mil pessoas), nem ousam passar por aqui. Utilizam o Terminal Real, um prédio majestoso com entrada particular e todas as mordomias inimagináveis. Minhas narinas me trouxeram de volta à realidade e embarquei no voo da Lufthansa em meio aos passageiros que em sua maioria era feita de muçulmanos. Prova viva que o islamismo está mesmo dominando a fé mundial.

Já em Frankfurt, comprei o ticket e fui para a estação esperar o trem que partiria em poucos minutos para a cidade alemã de Wiesbaden. Eram nove horas da manhã, o dia estava cinzento e os termômetros marcavam seis graus celsius. O trem deslizava vagarosamente em seus trilhos e o vento gelado entrava por uma das janelas. As árvores sem suas folhas acobreadas e as casas tipicamente germânicas me trouxeram boas lembranças destes lugares que outras vezes passei. A estação de trem de Wiesbaden, assim como as ruas do lugar, são bucolicamente elegantes. As lojas e o calçadão do centro da cidade emanavam decorações natalinas e vendiam árvores e guirlandas naturais que recendinham a pinheiro verdinho recém cortado. Junto à bela arquitetura da prefeitura e da igreja da cidade, acontecia a feira de Natal. Muitos estandes de artesanato, apresentações ao vivo e comida tradicional alemã. Perambulei incansavelmente em meio às tendas e fui atraída pelo cheiro de vinho de uma delas. Comprei uma caneca fumegante com GLÜHWEIN, uma espécie de quentão alemão. Vinho com cachaça, nós moscada, cardamomo, passas, cravo e canela. Continuei a trabalhar meu paladar e em outra tenda comprei salsichas condimentadas. Mais tarde também provei o KARTOFFELPUFFER, que são panquecas de batata com molho de maçã.

É chegada a hora de voltar ao aeroporto para seguir viagem até o meu destino final, o Brasil. Comprei o ticket certo, porém embarquei no trem errado. Quanto fui me dar conta estava em uma cidade estranha, bem distante do meu objetivo, o aeroporto. Tive que pegar cinco trens até avistar a estação correta. Entrei em todos eles sem pagar, torcendo que nenhum fiscal solicitasse o meu bilhete. Eu parecia o cavalinho de madeira dos carrosséis que giravam, subiam e desciam colorindo a feira de Natal. Afinal de contas, o espírito natalino também foi feito para cometermos presepadas.