sexta-feira, 14 de maio de 2010

Síria

Saímos de casa para o aeroporto antes mesmo do dia clarear. Eram cinco horas da manhã e o silêncio da madrugada deixou o som vindo dos minaretes das mesquitas ainda mais intenso. Acontecia a primeira reza do dia e os fiéis encaminhavam-se silenciosamente em direção aos locais de oração enquanto os grilos estrilavam. Embarcamos no voo da empresa low cost SAMA AIRLINES com destino à cidade de Damasco, na Síria.

Acho uma lástima os muçulmanos sauditas não gostarem de fotos e não aceitarem que a máquina fotográfica seja usada em muitos locais públicos. Este voo teria rendido imagens bastante curiosas. A maioria dos passageiros deste trecho eram muçulmanas iraquianas que estavam indo ou voltando da peregrinação até a cidade de Meca, conhecida como “peregrinação menor”, chamada de Umra. Esta peregrinação é feita em qualquer época do ano, diferente do Hajj, que acontece uma vez por ano em determinada data. Tanto o voo de ida quanto o de volta veio cheio destas iraquianas gordas que carregavam imensos sacos em suas cabeças. Elas queriam sentar em qualquer assento e tinham riscos pretos tatuados em seus rostos e suas mãos. Em coro, rezavam em voz alta próximo ao momento do pouso e da decolagem. No voo Damasco-Jeddah houve um atraso em razão de duas destas iraquianas terem defecado no chão da aeronave em frente ao banheiro traseiro. Foi até engraçado!

O visto para entrada na Síria foi retirado no desembarque, mas havia sido encaminhado alguns dias antes através de uma agência de turismo local. De certa forma, achei o aeroporto e a cidade limpos e organizados. A moeda do país é a libra síria, desvalorizada e com muitos zeros. Alguns lugares aceitam dolares americanos e euros. Damasco concorre ao título de “a mais antiga cidade continuamente habitada do mundo”.

Ficamos hospedados no Orient Palace Hotel, localizado na parte antiga da cidade, à 200 metros da parte histórica de Damasco. Em frente ao hotel existe uma vistosa estação de trem desativada, com um relógio em sua fachada e no seu interior fotos antigas da época em que grandes comerciantes e suas mercadorias circulavam por aqui. O hotel é da década de quarenta e conserva a mesma mobília e decoração de antigamente. Sem manutenção e sem grandes confortos, o banho era espetacular e o café da manhã servido com deliciosos baguetes (influência do mandato francês), acompanhados de labnah e azeitonas ao estilo árabe.

Circulamos pelas ruas da cidade e visitamos o Museu Nacional de Damasco, a Capela de St. Ananias e o Azem Palace. Depois de vagarmos por um longo tempo pelos labirintos do Souq al-Hamadiyyeh nos deparamos com a grandiosa Mesquita Ummayad e muitas pombas recebendo alimentos dos visitantes do local. Para entrar neste monumento islâmico, os sapatos são retirados e as mulheres cobrem seus cabelos usando um manto fornecido por eles. Aproveitando para fugir do calor, fiéis realizavam suas refeições sob o piso de mármore existente no pátio. No interior da mesquita, muçulmanos se curvavam em direção a cidade de Meca (centro do universo para eles), cumprindo os rituais diários de reza em homenagem ao grande e poderoso Allah. Os muçulmanos chegaram em Damasco no ano de 636.

Durante estes dias, não usei o meu modelo gótico da vestimenta tradicional muçulmana, e deixei minha abaya repressora trancafiada na mala durante a minha agradável estada na Síria.